Atravessou
rapidamente o lobby do hotel para fugir à chuva que começava a cair, entrou no
elevador e, mal as portas se fecharam, compôs a figura nos espelhos. Um barulho
estranho, um solavanco sobressaltado e a gaiola dourada parou.
Marcel
carregou em todos os botões, tentou forçar as portas, sem sucesso. Sabia que
era passageiro, que em Veneza as faltas de luz eram frequentes e curtas. O que
o aborrecia mesmo era estar ali fechado, entre dourados e damascos que não
conseguia ver.
E
ainda menos via o espectáculo que se desenrolava lá fora. Fechou os olhos e
imaginou o vento e a chuva a serem impedidos de entrar, como hóspedes
indesejados, a esmagarem-se nas janelas do terraço do Danieli, o céu de ardósia
rasgado por relâmpagos traçados por mão de criança.
Ah...
e o seu lanche.
O
chá fumegante para saborear devagar,
muito devagarinho, quase gota a gota, a madalena que mordiscava
quase a medo.
Marcel
entrou no salão. Na sua mesa habitual estava já o prato com o bolinho minúsculo
que lhe encheria a tarde. Só faltava pedir o chá. Chegara
a horas de recuperar o tempo perdido.
(Tarefa:
na pele de Dickens, Proust, G Sand ou Balzac, que viveram ou estiveram
hospedados no Hotel Danieli)
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