sábado, dezembro 31, 2011

Receita de Ano Novo

Receita de Ano Novo

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?).

Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um ano-novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

(Carlos Drummond de Andrade)

quinta-feira, dezembro 29, 2011

No reino de faz-de-conta

Arredondadas, às riscas pretas e vermelhas, parecem de brincar, desenhadas por mão de criança. Até o nome, Bungle Bungle, soa a rima infantil. Mas são montanhas a sério, de carne e osso, que é como quem diz, de pedra e terra.


Na vastidão desértica que é boa parte da Austrália não deixa, mesmo assim, de ser espantoso saber que só foram "descobertas" em 1983. Claro que os aborígenes que habitavam a zona há milhares de anos as conheciam mas para todo o resto da Austrália foram inexistentes até ao dia em que uma equipa de filmagens as utilizou como pano de fundo.
Hoje as Bungles são parte integrante do parque de Purnululu, no Kimberley australiano, e fazem parte do património da Unesco.

 O céu de chumbo parecia descansar sobre as montanhas tornando-as ainda menos reais, como se o chão que pisávamos fosse uma pista para o reino de faz-de-conta. Talvez por isso a falha estreita e enorme de Echidna Chasm me tenha transportado até Petra pela mão de um Indiana Jones qualquer e sob o olhar triste de um dingo aparecido do nada.

(Dingo - Foto de N. Raynaud)
Ninguém fala em Cathedral Gorge, sussurra-se com respeito, como se esperássemos a todo o momento que a cúpula natural fosse inundada pelos acordes de alguma sinfonia.

 

E o céu cada vez mais negro...
Russel chegou com a informação do fecho da Gibb River Road, por causa da muita chuva que já tinha caído. Se a situação se mantivesse e o nível das águas dos rios continuasse a subir, seria impossível transpô-los para sair do parque.

 A chuva começou a cair. Primeiro devagar, quase de mansinho. Era já forte quando nos apertámos sob um toldo improvisado para comer.  Era intensa quando, à luz das lanternas, desmontámos o acampamento, carregámos o camião e partimos com a velocidade que a pista enlameada permitia.

Duas horas e meia mais tarde, na escuridão da noite, foi com uma salva de palmas que festejámos a chegada ao asfalto.
Deve ter sido ilusão mas pareceu-me que na Cathedral Gorge alguém tocava uma Fuga de Bach.

sábado, dezembro 24, 2011

sexta-feira, dezembro 16, 2011

Na Gaiola da Morte

Os nossos 4 companheiros de mergulho já estão dentro de água. Denzel é grande, feio e de mau feitio; Bess, a única lady, é companheira de Houdini que, sem surpresas, é um mestre da fuga, e Chopper, bom ... o mínimo que se pode dizer é que é um lutador e que foi em confrontos violentos que perdeu dois membros.

Ah, esqueci-me de um pormenor: são salties, temíveis crocodilos australianos, monstros pré-históricos que chegam aos 5,5 metros e 790 kgs de Chopper E, sim, é com eles que vamos mergulhar.
Para descanso de todos e, sobretudo, nosso, é importante dizer que não é de corpinho bem feito que vamos enfrentar os colossos, mas dentro de uma gaiola de acrílico que dá pelo nome sugestivo e tranquilizador de Cage of Death.

Mesmo assim, o assunto é sério. Convidam-nos a sentar junto a uma mesa, estendem-nos um papel para assinarmos não sem que antes nos leiam os direitos e deveres, a longa lista dos perigos. Reforçam avisando que a actividade é potencialmente mortal, que "até hoje a caixa não se partiu com a força de um ataque mas, pode acontecer" e "não podem ignorar que, por vezes, o medo, provoca ataques cardíacos".
Tentamos ignorar a sensação esquisita no estômago, enchemos o peito de ar que, quem sabe,  só sairá num suspiro final, e deixamos que a caneta registe a nossa anuência.

 
Papéis assinados, fato de banho e óculos de natação, entramos na gaiola. O desentupidor de canos que nos passam para a mão servirá para nos fixarmos às paredes da caixa mantendo-nos no fundo.

A grade que é o nosso tecto fecha-se, a grua começa a deslocar-se lentamente e a mergulhar-nos no primeiro tanque onde Houdini e Bess nos esperam com indiferença. Esbracejamos, batemos nas paredes com as mãos , com os pés, com o desentupidor, agitamos a água  violentamente mas nem uma piscadela de olhos conseguimos provocar. 

 
Repetimos os exercícios cada vez com mais intensidade no tanque de Denzel. De Chopper aproximamo-nos a 50, 20 cm, tocamos-lhe mesmo com a gaiola e... nada, niente, zero.


Última tentativa, regresso ao lar do casal e, aleluia!, Houdini está um pouco mais activo, dá sinais de alguma agitação. Sem parar de esbracejar vimo-lo começar a deslocar-se na nossa direcção e, com ar indolente, passar mesmo junto a nós e nadar até ao fundo da piscina, provavelmente para lá encontrar o descanso que não lhe estávamos a permitir.


Mergulhar com crocodilos? Pffff... Venham os tubarões!

Cage ofDeath, Crocosaurus Cove, Darwin, Austrália

domingo, novembro 27, 2011

Vamos ao cinema?

 

O filme passa nos pontos de água de Etosha e, se o visse na TV, pensava que era uma feliz reunião de momentos invulgarmente ricos em vida selvagem, feito ao longo de meses de espera e paciência.
Qual quê! O corrupio era constante, o charco de água era a passerelle por onde passava tudo o que Etosha tem para mostrar. E é muito.



De dia víamo-los aproximarem-se, amontoarem-se para disputar uns goles de água. Gnus, órixes, impalas, ...
As zebras alinhavam-se, paralelas, talvez para que as riscas confundam ainda mais algum predador que esteja à espreita.
Mais cautelosas são as girafas. De pernas afastadas para manter o equilíbrio  enquanto levam a cabeça até ao nível da água, tornam-se vulneráveis a ataques, impossibilitadas de reagir e fugir rapidamente. Só bebem quando o charco está mais desimpedido e há sempre uma que fica a vigiar enquanto as restantes matam a sede.


À noite é a vez dos que pouco têm a perder com as escuridão: os grandes e os carnívoros. Ao contrário do que sucede de dia nunca vimos espécies misturadas. Os elefantes chegam majestosos e em silêncio, sem qualquer barulho que anuncie a sua chegada, recuam estrategicamente para o meio da vegetação para deixar que uma hiena se aproxime a correr, beba um trago e se afaste ainda mais depressa.
Com o palco desimpedido os elefantes regressam e logo partem com barridos que enchem a noite, cedendo a vez ao rinoceronte.
E quando os grandes já estão saciados é a vez das lebres e coelhos invadirem o espaço com correrias e saltos.


Na falta de fotografias das noites de Etosha ficam aqui e aqui dois conjuntos de imagens de dia.

domingo, novembro 13, 2011

No São Martinho vai à adega e prova o vinho


Patrono de cavalos e cavaleiros, de pedintes, produtores de vinho e até de alcoólicos reformados, a São Martinho está associado o templo clemente que muitas vezes abençao os dias em redor de 11 de Novembro - o verão de São Martinho.


Martinho atravessava os Alpes a cavalo, no regresso a França. A neve e o vento forte tornavam  a travessia difícil mas a capa que fazia parte do seu uniforme de soldado mantinha-o abrigado. A certa altura, no meio de uma tempestade, deparou-se com um velho andrajoso, transido de frio. Não tendo mais nada para lhe dar, Martinho rasgou ao meio a sua capa e entregou uma parte ao idoso,
O Bom Deus ter-se-á impressionado com a solidadriedade do cavaleiro e, num instante, a neve e o vento desapareceram e o sol brilhou no céu como se fosse verão.

 
 Lendas à parte, o melhor do São Martinho vive-se na Golegã. 


Mais fotografias aqui.

sábado, outubro 08, 2011

A gota de água


O sol a pique parece queimar a vegetação seca e rasteira de Etosha, a savana perdeu os verdes exuberantes que a cobrem na altura das chuvas. Mas é agora mais fácil observar a vida animal que se concentra nos poucos e preciosos pontos de água. E que vida!



Os elefantes acabaram de partir mas a manada de gnus acabou de chegar, vinda do lado oposto da de zebras que já cá estavam. Um par de órixes enceta uma perseguição poeirenta atravessando um grupo de springbobks que tentava manter-se à margem do conflito, o casal de avestruzes afasta impalas para que as suas 16 crias possam beber em segurança, enquanto o chacal espreita uma oportunidade conseguir refeição.



As girafas aproximam-se mas aguardam a sua vez para beberem, as zebras escoiceando-se, mordem-se, e a passarada esvoaça por todo o lado.


Uf! Nos pontos de água de Etosha o olhar não tem descanso!

quarta-feira, outubro 05, 2011

Uadi Anas, Guadiana


O álbum de fotografias da descida do Guadiana em caiaque pode ser visto aqui.

Guadiana

Guadiana
(Rui Veloso canta Carlos Tê)

Corre nobre Guadiana
espelho de moura formosa
vai ficando uma ribeira
pela terra sequiosa

Nunca pensei assistir
à tua dor na charneca
és como um Deus a cair
Ante a barbárie da seca

Corre corre Guadiana
pela terra alentejana
pudesse eu dar-te esta canção
a vertigem dos caudais
dar-te o farto aluvião
das águas primordiais

E ver-te com dignidade
a correr entre os campos
como o rio que tem um caminho
desde o começo dos tempos

Ouve as pedras do teu leito
a pedir que não as deixes
ouve os barcos parados
ouve os homens ouve os peixes

Corre corre Guadiana
por essa terra raiana
que eu faço um apelo aos lagos
convoco nos céus as fontes
teço três meadas de água
dos fios perdidos nos montes



sexta-feira, setembro 30, 2011

Moses


Moses vende cebolas à beira da estrada, em Tsumeb, onde fizemos uma paragem logística. Vendo-me passar de máquina fotográfica ao pescoço, arrisca, esperançado:
"Queres tirar-me uma foto? São 10 dólares."
Páro, encolho os ombros, e é a minha vez de atirar uma pergunta: "E porque é que eu havia de te querer fotografar?"

A resposta e o meu ar indiferente surpreenderam o rapaz que abre os olhos, admirado, enquanto eu continuo: "Ainda por cima a máquina é minha, o trabalho é meu. Se queres que te tire uma fotografia és tu que tens de pagar."

Moses olha para mim em silêncio com o ar meio incrédulo de quem não percebe muito bem o que se está a passar. Sorrio e acrescento: "Não quero tirar-te fotografias mas, se quiseres, posso ajudar-te a fazer os sacos de cebolas."

No rosto de Moses desenha-se um sorriso aliviado e é com entusiasmo que me mostra como cortar a rede para fazer um saco, quantas cebolas a pôr em cada um. E lá fui enchendo alguns sacos até que Moses ganhou coragem para fazer timidamente a pergunta que se esperava:

"Podes tirar-me uma fotografia, mas sem eu pagar?"





quinta-feira, setembro 15, 2011

Namíbia, Land of the Brave

Se à chegada me pedissem que descrevesse a Namíbia numa só palavra escolheria "asséptica", que associei às primeiras impressões do país. Aeroporto organizado, o alcatrão das estradas em bom estado, trânsito respeitador e cidades sem o caos de Nairobi ou Maputo. A Namíbia mostra o que é: uma nação movida pela força e entusiasmo próprios da jovem que é. Por detrás sente-se a herança paterna, a mão organizada dos alemães e sul-africanos que durante anos a dirigiram.

Mas, felizmente, não deixa de ser como os outros países africanos, uma terra de contrastes onde encontramos mulheres de tronco nu, filhos às costas e telemóvel na mão, homens com saias de folhos e t-shirts "ocidentais".


Um país onde as cidades transmitem segurança mas que, como na RSA, não deixam de ter gradeamentos electrificados e avisos de intervenção armada.
Um país onde a tradição e o progresso parecem co-existir sem demasiados choques, onde o sorriso é espontâneo. Uma terra de paisagens magníficas e variadas, de fauna exuberante, um canto do mundo que vale a pena conhecer.




Vamos a isso!




sábado, agosto 27, 2011

Paris?

E porque a Nomade se enganou ao dar-me as datas dos vôos, se não conseguir trocar o que em leva para casa, é em Paris que passo este dia.

quinta-feira, agosto 25, 2011

Amani?


Enquanto fazemos horas para o vôo da noite talvez haja tempo para um saltinho ao Amani Lodge onde podemos ver bem de perto alguns felinos.

quarta-feira, agosto 24, 2011

Regresso a Windoek


Colónia alemã de 1884 a 1915 não surpreende que nela se encontrem as melhores cervejas do continente africano.
À chegada à capital vai saber bem uma Windoek fresquinha.

terça-feira, agosto 23, 2011

Kalahari


Muitos desertos povoam o meu imaginário e este é um deles. Vou, finalmente, pôr um pé nas areias do Kalahari.

domingo, agosto 21, 2011