segunda-feira, dezembro 31, 2012
terça-feira, setembro 04, 2012
Que Praga!
Chamava-se João Nepomuceno, era padre, e recusou-se a revelar ao rei Venceslau os segredos que a rainha lhe revelara em confissão. Como castigo foi atirado de uma ponte para as águas do Vlatva. Como prémio, fraca consolação, foi canonizado e a sua estátua é uma das que ornamentam a ponte Carlos, em Praga.
É cedo, apesar do sol já ir alto no céu de agosto. Partilho a ponte com alguns, poucos, japoneses, que, como eu, aproveitam a tranquilidade matutina. Aos poucos a cidade desperta, espreguiça-se abraçada ao rio. Passam bicicletas, passeiam-se crianças e cães, os pescadores instalam-se no seu canto preferido.
Os primeiros vendedores instalam as bancas de lembranças e gravuras à espera dos visitantes que não tardam a chegar. Os carteiristas virão logo a seguir e também os músicos que alegrarão o dia com uns acordes de jazz.
São horas de partir, de subir até ao castelo e à catedral, descer por ruelas cheias de pormenores, parar no relógio para olhar personagens e planetas, e ficar também a ver quem para ele olha.
A noite cai acompanhada por um copo de cerveja local e deixo que os meus sonhos sejam embalados pelo balancear do "botel" atracado no cais. Boa noite, Praga.
segunda-feira, agosto 27, 2012
Cerveja... da cabeça aos pés
A cerveja deve consumir-se moderadamente. A cerveja quer-se bem gelada.
O consumo de cerveja na República Checa é quase assustador, nada menos que 132 litros anuais per capita. Mas, será que este número justifica que eu tenha esvaziado um recipiente com largas dezenas de litros de "cevadinha" em menos de meia hora? E que prazer pode dar cerveja a 34º?
Muito, como se vai ver.
A cena passa-se em Planá, na Boémia ocidental, no Spa de cerveja Chodovar onde estive imersa num banho de cerveja espumosa e deliciosamente morna, temperada com água mineral e ervas medicinais. Ao lado da banheira de inox uma caneca de cerveja, esta fresquinha, para bebericar durante o banho. Enquanto isso o líquido dourado penetra nos poros e actua a nível físio e neurológico.
Vinte minutos passados e a matrona que nos fez as honras do spa retira a tampa da banheira e faz-me seguir, embrulhada num cobertor, para uma caverna escassamente iluminada, para mais outros tantos minutos de repouso, relaxe e, quiçá, meditação.
O tempo chega ao fim. Saio descontraída, com a pele mais suave e cheirosa e promessas de cura de celulite e acne, alívio de problemas mentais, diminuição da tensão arterial e melhoria da circulação.
Quem disse que o excesso de cerveja não faz bem à saúde?
sábado, agosto 18, 2012
Badalada suspensa
Os três romenos entretinham-se em filmes e fotografias e Guiliana deixou que os pensamentos acompanhassem o deslizar da gôndola.
Estava
diferente nesse fim de tarde, mergulhada numa inquietação que já não sentia há
muito. Desde
pequena que o barco era o seu mundo; tentara, e conseguira, ser a primeira
gondoleira. E era precisamente a ansiedade desconfortável do primeiro dia, que
sentia hoje.
Passaram
pela ponte delle Meraviglie e Giuliana olhou por acaso para a fondamenta junto
à Cantine del Vino gia Schiavi onde um pequeno grupo saboreava o fim da tarde
num copo de prosecco .
Luigi
o único homem a quem amara verdadeiramente, estava entre eles, a conversar,
vestido de negro, um rectângulo branco a interromper a severidade do hábito.
Os
sinos descontrolados pareceram suspender uma meia badalada mas, quando
recuperaram o ritmo, a remada tornou-se enérgica e, para alegria dos romenos,
Giuliana entoou um sentido “Ó sole mio”.
quinta-feira, agosto 16, 2012
Uma tarde, nunca é tarde
Atravessou
rapidamente o lobby do hotel para fugir à chuva que começava a cair, entrou no
elevador e, mal as portas se fecharam, compôs a figura nos espelhos. Um barulho
estranho, um solavanco sobressaltado e a gaiola dourada parou.
Marcel
carregou em todos os botões, tentou forçar as portas, sem sucesso. Sabia que
era passageiro, que em Veneza as faltas de luz eram frequentes e curtas. O que
o aborrecia mesmo era estar ali fechado, entre dourados e damascos que não
conseguia ver.
E
ainda menos via o espectáculo que se desenrolava lá fora. Fechou os olhos e
imaginou o vento e a chuva a serem impedidos de entrar, como hóspedes
indesejados, a esmagarem-se nas janelas do terraço do Danieli, o céu de ardósia
rasgado por relâmpagos traçados por mão de criança.
Ah...
e o seu lanche.
O
chá fumegante para saborear devagar,
muito devagarinho, quase gota a gota, a madalena que mordiscava
quase a medo.
Marcel
entrou no salão. Na sua mesa habitual estava já o prato com o bolinho minúsculo
que lhe encheria a tarde. Só faltava pedir o chá. Chegara
a horas de recuperar o tempo perdido.
(Tarefa:
na pele de Dickens, Proust, G Sand ou Balzac, que viveram ou estiveram
hospedados no Hotel Danieli)
terça-feira, agosto 14, 2012
Milagre veneziano
“Não,
Margaretta, não estás na grande pirâmide do Egipto, mas na Campanille de
Veneza. A frase não é essa. Deixa-te de tonterias e aproveita o espectáculo.”
Obedeço
com uma piscadela de olhos, tiro a máquina fotográfica da mochila, procuro
ângulos e cantos. As cadeiras amarelas da piazzetta San Marco com a ilha de San
Giorgio ao fundo? Humm, agrada-me.
Passo
as mãos e a máquina pelas grades e preparo-me para disparar. O alemão gordo que
subira connosco no elevador empurra-me e, ... OMG!, a máquina salta-me das
mãos e desce vertiginosamente esmagando-se no chão de pedra. Corro
para o elevador, impaciente. Há fila. Grande. Vá, anda! Oh meus deus, a máquina
e, mais do que ela, as fotos que lá estão.
Aqueles
telhados ali, andei debaixo deles ainda ontem, na companhia de gatos e de
Corto. A basílica de la Salute,a colá. Perdi os vídeos do concerto de órgão que
ouvimos lá.
E a piazza san Marco ao lusco-fusco, a ângustia do miúdo a que deixou a bola cair no canal, ali mesmo, olha, foi mesmo naquele sítio.
Vês
o ghetto lá ao fundo? Aquele telhado junto à torre inclinada? Foi aí que nos
sentámos a escrever sobre a misteriosa Valentina.
Perdi
tudo, tudo. Todas as minhas memórias esmagadas lá em baixo.
Saio
finalmente do elevador, varro o chão com os olhos desesperados, à procura dos
restos da máquina. Nada. Os ombros caem, impotentes, e nem sentem a mão que
lhes toca e me estende um cartão de memória que sobressai de um puzzle de peças
negras.
“É
seu?”
“Obrigada,
senhor, obrigada. Como se chama?”
“Eu?
Marco, san Marco. Encantado.”
(Tarefa:
do alto da Campanille)
strč prst skrz krk
(imagem: Coffee+dumplings+komiks)
Muitas palavras checas têm sequências de consoantes que nos enrolam a
língua. O que não sabia é que se pode escrever toda uma frase sem uma
única vogal!
Como "Strč prst skrz krk" que significa "Coloque o seu dedo pelo pescoço".
domingo, agosto 12, 2012
Relógio a dois tempos
O coração de Aaron batia descompassado como um relógio a que faltasse afinação. Fora por pouco mas conseguira saltar já o barco se afastava do cais.
Se
não o apanhasse... Nem queria pensar no que podia acontecer se ainda estivesse
em San Marco depois do pôr-do-sol.
A
Giudecca desenhava-se no horizonte e só a vista da ilha o descansou. Seguira as
regras, cumprira a sua obrigação.
Revoltava-o a imposição de abandonar San Marco com o sol. Os mesmos que durante o dia lhe sorriam ao estender osrelógios para que os reparasse com delicada minúcia, empurravam-no para o outro lado do canal. Como que um relógio a dois tempos. Fechadas as portas da loja fechavam-se também as da tolerância.
Nem um pé judeu podia pisar Veneza depois do sol se esconder. Como se alguém tivesse medo que espezinhasse San Marco.
O
barco acostou em Zitelle e Aaron saltou para o solo que parecia ainda balouçar.
Chegara ao seu refúgo, à sua prisão. E, como todos os dias, engoliu uma lágrima
cansada.
sexta-feira, agosto 10, 2012
Se non è vero...
A
água verde pastosa da fondamenta Cá Balá reflecte o vulto de dois homens
apoiados no parapeito da ponte.
“Sabes
o que me fez ficar por aqui, há tanto ano?”, perguntou o mais velho,
continuando sem esperar a resposta. “O ritmo poético das águas, que parece
embalar as palavras fazê-las dançar.”
O
outro, rosto anguloso de rugas traçadas como num mapa, limitou-se a acenar
lentamente e continuouo a fixar a água que parecia querer atraí-lo ao infinito.
“Não
foram os canais nem tão pouco uma mulher, foi esta água que parece respirar,
transfigurar-se ao sabor das marés. Acreditas, Corto?”
“Benne, se non è vero è ben trovato.”, respondeu o
marinheiro.
quarta-feira, agosto 08, 2012
O poço dos desejos
“Sabe,
donna, o que eu gostava era de sair daqui, viajar, conhecer outros lugares.”
Estamos num tranquilo pátio veneziano. Um poço grande,
roupas estendidas ao vento como bandeiras venezianas. E ela, de bata azul,
sentada num banco.
“P’rali,
por exemplo”, apontando para uma toalha do Brasil. “O meu único irmão foi para
lá, em novo. Viveu carnavais e futebóis, lutou pela vida e por lá acabou por
morrer, sozinho, esquecido.”
“Patetices
de velha”, acrescentou depois de engolir a saudade. “Se ao menos aquele poço
fosse um poço dos desejos...”
As
bandeiras tibetanas pararam de dançar e o poço branco mudou de côr, vestiu-se
de Arlequim.
Foi
a sorrir que lhe estendi uma moeda dizendo:
”Quer
experimentar?”
segunda-feira, agosto 06, 2012
Grego em Veneza
“O
que escondes, Leo? Qual de vós esconde a pista para a clavícula de Salomão, a
pista apagada pelas brumas de Veneza?”
O
olhar de Corto pousa longamente em cada um dos quatros leões do Arsenal. Olhos
nos olhos, apenas, tentando que o olhar, por si só, lhe revelasse o que
procurava. Não seria, com certeza, o da direita, deitado junto à água,
demasiado fácil de confundir com um carneiro. Nem os seguintes, de ar cómico ou
sorridente. Teria de ser o último, o da esquerda, o mais digno, orgulhoso do
rei que era.
Com
a certeza na alma Corto avançou, olhou-o de frente, à espera da confirmação.
Não podia haver dúvida. Era este. Só podia ser este. O grego.
Não,
não pode ser no peito, nem no lado da ponte, demasiado visíveis para quem chega
ao Arsenal. O que procurava teria de estar no flanco menos exposto, o direito.
Só
então Corto se aproximou da estátua, colocou-se ao seu lado e, claro, encontrou
o que procurava e deixou que a mão calejada pela vida acariciasse uma a uma as
letras indecifráveis gravadas na pedra.
domingo, agosto 05, 2012
Ponte sem passagem
Um
dois, três, é a minha vez. A tarefa é simples: uma ponte com três arcos, vinte
minutos, vinte linhas. Na primeira pessoa, que sou eu.
A
mão, carcomida por uma grave artrose cerebral, segura a caneta sem convicção, à
espera da luz que teima em não acender.
É
uma porta fechada, muda, como a da Casa di Corto, Portas que recusam a abrir-se,
que escondem sabe-se lá o quê. Corto, como Alice, já não mora ali. Por onde
navegas, marinheiro? Por onde andas, musa inspiradora? Pelos mares do sul?
sábado, agosto 04, 2012
Ciao bello!
Alessandro
estende-nos a mão conduzindo-nos para a sua gôndola. Uma, duas remadas e
flutuamos no canal. É uma outra Veneza que se revela. Somos agora o alvo das
objectivas dos turistas em terra firme. Descobrimos marcas, portas corroídas
pela água e pelo tempo, patos de borracha com ânsia de nadar. Há pés que
procuram nas águas o alívio dos muitos passos dados, casais que se enlaçam num
beijo apertado, crianças que acenam. Jogos de luz e sombra, reflexos que dançam
na água ao ritmo do assobio de Alessandro.
Sem
darmos por isso a gôndola encosta, pede descanso, e a mão de Alessandro
estende-se para nos ajudar a pôr o pé em terra.
sexta-feira, agosto 03, 2012
O poço do ghetto
Passou
pelo primeiro poço sem o ver. Ao segundo, mais distante, deitou um olhar
desinteressado e foi ao chegar ao terceiro que abrandou o passo e parou. Com um
ar aparentemente descontraído olhou-o de
todos os lados. A mão passou discreta sobre a tampa de metal, como se a
acariciasse de uma forma quase sensual, os dedos nervosos percorreram o rebordo
até pararem junto a um pedaço de papel que, mais do que se ver, se sentia.
Retirou-o
à pressa e guardou-o, olhando à sua volta para se assegurar que ninguém a tinha
visto.
Respirou
fundo e avançou, agora mais confiante. No rosto que se escondia sob uma
maquilhagem carregada pintava-se agora um sorriso.
Atravessou o pátio, cruzando os arcos, entrou na sala de pedra, pequena e escura, e sentou-se. Só aí Valentina pegou no papel, desdobrou-o com cuidado. Um sorriso iluminou os olhos de um verde que contrastava com o escarlate provocante dos lábios. Acomodou-se na cadeira e esperou.
Já
perto do fim do dia, ao pátio deserto chegou uma sombra longa. Avançou sem
hesitações, passou pelo primeiro poço,
pelo segundo e, como Valentina, tacteou o rebordo em busca do que já não estava
lá.
domingo, julho 22, 2012
Sábado selvagem. Grrrrrrrr!
Ontem foi dia de "Sábado Selvagem", um programa do Jardim Zoológico de Lisboa em que se tem a oportunidade de entrar em alguns bastidores e nos recintos de koalas, lémures, golfinhos. Além das imagens dete post há também um álbum aqui ou no link à direita "Álbum de Fotografias / Zoo de Lisboa".
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