As nuvens nos Açores têm uma vida extraordinária, uma vida que não percebo bem! Hoje uma sobre o Corvo lembra uma auréola magnética.
Aqui acabam as palavras, aqui acaba o mundo; aqui neste tremendo isolamento onde a vida artificial está reduzida ao mínimo só as coisas eternas perduram.
Nem uma árvore, só erva verde tosqiada e junco vermelho. O céu enfumado e muito baixo pousa sobre os bordos do vasto caldeirão. As rampas de um verde-claro descem até ao fundo [...] Olho o vasto coliseu. Pedras, calhaus cobertos de líquenes, foram atirados a esmo por todos os lados.
[...] os grandes paredões riscados de bronze e verde, as águas quietas, a luz fria e a solidão petrificada com o céu pousado sobre as nossas cabeças, transportam-me de repente para outro planeta, para o interior estranho de uma cratera lunar, para um mundo de sonho, habitado pelos gurajaus brancos que passam lá em cima como plumas.
O nevoeiro cor de pérola desce devagar dos bordos, arrasta-se pelas paredes deixando-as molhadas, entranha-se e afoga o Caldeirão, transformando-o numa grande fantasmagoria, dando-lhe personalidade e vida, para outra vez se erguer lentamente em silêncio, deixando à mostra o primeiro lago com ilhotas boiando como monstros petrificados, depois todo o fundo, depois os enormes paredões até lá acima.
in As Ilhas Desconhecidas, Raul Brandão
2 comentários:
o meu coraçãozinho semi-açoreano bate mais forte ao ver estas fotografias! fenomenal! **
:-) Os Açores são do mais bonito que há no planeta.
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