A ligação entre as pincipais cidades de Madagáscar, seja ela por estradas ou por pistas, é garantida pelos "taxy-brosy"- carrinhas, camionetas ou mini-autocarros - em condições mais ou menos precárias. Muitos dos que cruzámos ostentavam uma placa de "transporte especial" porque, no tejadilho, misturado com cestos, sacos de arroz, galinhas, colchões, móveis e bicicletas, ia um caixão.
É curiosa a relação dos malgaxes com a morte que, aliás, consideram a parte mais importante da vida. As exéquias dos membros da tribo Antaisaka têm tempos rigorosamente marcados. A um primeiro sinal todas as mulheres choram, a um 2º calam-se e é a vez das crianças cantarem para, logo a seguir, todos dançarem.
Mas bem mais curioso é o famadihana, traduzido um pouco livremente por "revirar os mortos", cerimónia própria dos Betsileo e dos Merina, que tem lugar 4 a 7 anos após a morte. É, ao contrário do que se possa pensar, uma ocasião alegre, uma oportunidade para comunicar com o espírito do defunto.
No dia escolhido pelo adivinho-astrólogo, sempre na estação seca, entre Junho e Setembro, familiares e amigos dirigem-se ao túmulo familiar e hasteiam a bandeira malgaxe. Os restos do antepassado são, então, retirados, lavados, embrulhados numa nova mortalha e transportados até casa onde os parentes próximos aproveitam para tocar, conversar, pedir a benção, pôr ao corrente das notícias da família, da aldeia. Pedaços da antiga mortalha são disputados pelas jovens e mulheres em idade fértil e colocados debaixo do colchão para garantir uma prole numerosa.
A banda contratada toca, o rum corre, a comida é servida. Os familiares mais chegados colocam alternadamente o corpo aos ombros e com ele dançam e pulam. A festa dura cerca de uma semana, é feita por famílias ricas ou pobres, dos meios rurais ou urbanos e é cara, muito cara. Ao custo da nova mortalha, de seda, há que juntar comida e bebida de algumas centenas de convidados, pagamento à banda e ao adivinho, taxas administrativas e presentes para a aldeia. Finalmente o corpo regressa ao túmulo onde é fechado até ao próximo famadihana.
Cereja em cima do bolo, tivemos a sorte de deparar com uma celebração e pudemos assistir, em silêncio e sem ousar fotografar, à dança frenética de uma mulher que abraçava um defunto envolvido numa esteira. Pela energia com que pulava(m) quis-nos parecer que, no final da cerimónia poucos dos ossos estariam no lugar correcto.