domingo, setembro 27, 2009

Just a Gigolo

Continuamos na mítica Ruta 40. A paisagem adoça-se com o amarelo dos campos, com a serenidade que os cactos emprestam às colinas. Mas logo depois a pista estreita-se, contorce-se em curvas apertadas que nos transportam montanha acima.

O gelo acumula-se nas bermas, o ar cada vez mais rarefeito torna penosa a progressão dos jipes que só a custo vencem o desnível e o piso esburacado.

A noite aproxima-se , as montanhas vestem-se de gala. No céu, os vermelhos do pôr-do-sol cedem o lugar aos azuis rosados do crepúsculo. A lua aparece e no nosso jipe a chegada aos 4895 metros do Abra del Acay faz-se acompanhando desafinadamente Louis Prima que canta "Just a gigolo".

terça-feira, setembro 22, 2009

Álbum de Fotografias - Buenos Aires

O primeiro álbum de fotografias da viagem pela Argentina, Bolívia e Chile pode ser visto aqui ou na margem do blogue em Álbum de fotografias /Buenos Aires.

domingo, setembro 20, 2009

O Faroeste argentino

Se calhar é um sonho, um sonho lindo onde as montanhas sucedem aos vales e estes às gargantas apertadas, às rochas de formações bizarras, aos desfiladeiros. Um rio com pouca água serpenteia indolente na aridez da paisagem e as poucas árvores são de um verde gritante que contrasta com os tons ocre das montanhas.

Ou então é um filme e um grupo de índios pintados para a guerra vai descer, numa cavalgada alucinante e no meio de gritos e de poeira, uma das colinas semeadas de cactos e atacar os cowboys que julgamos ser.
Ou serão alucinações provocadas pela altitude a que andamos?

Sonho, filme, alucinações.. certo é que tanta beleza parece irreal. Que bonito é o faroeste argentino!

domingo, setembro 06, 2009

Bê-á, BA

A viagem seguiu as regras do alfabeto: a, b, c, Argentina, Bolívia, Chile. E começou pelo bê-á-bá, BA, de Buenos Aires, a capital mais europeia da América latina. Não admira, pois, dizimados os indígenas pelos descobridores espanhóis, raros são os seus habitantes que não têm origem espanhola, italiana, alemã. Mas nem por isso é uma cidade homogénea, ganha alma na diversidade dos seus bairros.

O luxuoso Palermo com casas apalaçadas e relvados bem tratados onde a alta sociedade passeia os seus cãezinhos aperaltados. O popular La Boca, de casas coloridas e a animação do tango dançado à porta dos restaurantes, dos pintores de rua, dos deuses Gardel e Maradona.

O sofisticado Recoleta e o seu cemitério onde gatos bem nutridos se passeiam junto à campa da venerada de Evita Peron. O típico San Telmo de com as passagens que escondem galerias de antiquários e bric-à-brac, as "tangotecas".
E os cafés, o café e ritual do mate, as feiras e os mercados, os protestos, as mães de Maio.

Buenos Aires. Tanto para ver e tão pouco o tempo...

terça-feira, setembro 01, 2009

Dinamite Kids

"Têm apenas 1 minuto para as fotografias." Os olhos de Soledad abrem-se como que para reforçar as palavras. Somos quatro e temos uns 10 segundos cada para imortalizar a nossa imagem com um bastão de dinamite nas mãos. Ai, ai...


Ainda mal a última foto estava feita e já Soledad corria para enterrar a dinamite numa covita da encosta. E mais depresa corria no regresso, para se afastar do local da explosão.

Buuuuuuuuummmm! Bem vindos à mina de prata de Cerro Rico, em Potosi!

Vestidos a rigor, com fatos, botas, capacete e lâmpada, entramos na mina como se foramos quatro dos anões de Branca de Neve, entoado baixinho:
A nossa enxada, a nossa pá
Nós usamos pra cavar
Cavando a nossa mina

Noite e dia sem parar
O túnel escuro estreita-se, reduz-se, andamos curvados, os pés a fazer "chlep-chlep" na água que cobre o chão. Preparamos as nossas oferendas, em jeito de pedido de protecção a El Tio, o diabo que reina nos infernos da mina: um cigarro aceso, álcool a 96º, que o rótulo assegura ser potável e de bom sabor, e um punhado de folhas de coca. A temperatura sobe à medida que descemos os túneis cada vez mais baixos e estreitos.

Juan, mineiro, cansado dos seus 20 anos de mina, explica-nos que a prata está praticamente esgotada, que aqui se trabalha de forma artesanal, 6 dias por semana, todas as semanas. Dos 14 aos 45 anos, se a saúde e a sorte o permitirem, se a protecção de El Tio não faltar.
Juan não gosta do cartaz que, à entrada da mina, afixa o número de dias consecutivos sem acidentes - 56. Como se o aumentar do número fosse um mau presságio, fizesse crescer a probabilidade de um acidente.

Regressamos à luz do dia, ao ar seco e frio de Potosi. Para nós não foi mais do que uma visita; para eles, mineiros, é o trabalho duro e arriscado, a incerteza dos ganhos sempre reduzidos, a incerteza de rever os filhos que cada dia beijam como se fosse o último, a corda bamba da vida.

Que El Tio os proteja!
Fotografias: Nicole e MMP